Conheça a trajetória de um oficial gay no exército e a luta por reconhecimento e direitos iguais
Dentro das Forças Armadas, histórias de resistência e superação LGBTQIA+ ainda são pouco contadas, mas existirem soldados que vivem essa realidade é uma certeza. Mateusz, um oficial que serviu em missões no Oriente Médio, compartilha sua experiência de ser um homem gay em um ambiente tradicionalmente conservador e militarizado.
O início da jornada na caserna
Enviado ao liceu aeronáutico pelo apoio dos pais, Mateusz não teve muitas escolhas: a carreira militar parecia ser seu destino. Ainda que consciente de sua orientação sexual, manteve-se discreto, evitando expor sua identidade para preservar seu espaço e foco nos estudos e na profissão.
Com o passar dos anos, principalmente durante a universidade, o desejo de viver com mais autenticidade cresceu, e a vontade de se assumir para amigos próximos e colegas de trabalho tornou-se mais forte.
Um coming out que repercutiu
O passo decisivo veio através de uma entrevista numa revista LGBTQIA+, que acabou viralizando dentro da sua unidade militar. A notícia se espalhou rapidamente, chegando até o alto comando das Forças Armadas, que reagiu com uma notificação formal à sua unidade. No entanto, surpreendentemente, o apoio dos superiores diretos predominou, e as represálias se limitaram a uma advertência administrativa.
Mateusz percebeu que, mesmo em um ambiente rígido, o preconceito nem sempre se manifesta de forma ostensiva – muitas vezes, é o medo e a desinformação que alimentam a exclusão.
Desafios invisíveis e a falta de amparo institucional
Embora não tenha sofrido diretamente perseguições, o oficial conta que não existe uma instituição dentro das Forças Armadas dedicada a proteger os direitos dos militares LGBTQIA+. Em casos de discriminação, a alternativa seria recorrer à justiça civil, pois uma condenação por discriminação pode levar à perda do credenciamento de segurança e, consequentemente, à expulsão do serviço.
Essa ausência de mecanismos internos de apoio ressalta a necessidade urgente de políticas claras e inclusivas para garantir um ambiente verdadeiramente seguro e acolhedor para todos os soldados.
Entre estigmas e estereótipos
Mateusz também menciona que, mesmo em meio a comentários preconceituosos que associam sua orientação à suposta ameaça à imagem das Forças Armadas, ele mantém a convicção de que sua identidade sexual não interfere em sua competência ou profissionalismo. Pelo contrário, ele acredita que o desempenho e a dedicação são os verdadeiros critérios de avaliação no serviço militar.
A percepção de uma cultura mais aberta nas Forças Aéreas, em comparação com os exércitos de terra, também foi destacada. Segundo ele, a diversidade de personalidades e talentos nessa área contribui para um ambiente menos rígido e mais receptivo.
Experiências em missões internacionais
Servindo em missões em Kuweit e Iraque, Mateusz relata que o convívio com militares estrangeiros LGBTQIA+ foi possível, apesar das restrições impostas pela pandemia de COVID-19. A experiência internacional mostrou que a inclusão é viável, e que o preconceito pode ser enfrentado em diferentes contextos.
O sonho por liberdade e reconhecimento
Depois de anos dedicados ao exército, Mateusz decidiu se desligar devido ao desgaste físico e emocional. Ele buscava, acima de tudo, liberdade para expressar sua identidade, como poder deixar crescer a barba e os cabelos, algo que o ambiente militar não permitia.
Hoje, ele atua como designer de interiores, realizando seu sonho de trabalhar com criatividade e autenticidade, longe das amarras do passado.
Direitos negados e a luta por igualdade
Mateusz também destaca as dificuldades enfrentadas por casais LGBTQIA+ no Brasil, especialmente na ausência de reconhecimento legal de uniões estáveis ou casamento. A negação de direitos básicos, como acesso a informações médicas do parceiro ou benefícios previdenciários, torna a vida cotidiana uma constante batalha.
Ele reforça que o desejo é simples: ter os mesmos direitos e respeitar a dignidade humana, sem que a orientação sexual seja motivo para exclusão ou discriminação.
Uma mensagem para o futuro
A trajetória de Mateusz nas Forças Armadas brasileiras é um exemplo de coragem e resistência. Sua história inspira uma reflexão profunda sobre a necessidade de inclusão, respeito e políticas públicas que garantam a segurança e a valorização dos militares LGBTQIA+.
Num país ainda marcado por preconceitos, sua voz ecoa como um chamado para que todos possam servir ao país com orgulho, sem abrir mão de quem realmente são.