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As conquistas do movimento gay 40 anos após Stonewall

Apesar de ser tratada por muitos ainda hoje como uma espécie de tabu, a homossexualidade é mais natural – ou antiga – do que parece. Os primeiros registros que se tem notícia datam de cerca de 12 mil anos antes da vinda do filho de Deus à Terra (que também poderia ter sido gay, por que não?). Eram pinturas em cavernas que retratavam a relação entre dois homens ou duas mulheres. Também fora encontrado um relato homoerótico do século XXVIII A.C. O que dizer então das histórias mais do que conhecidas da Grécia Antiga, que atribuía à homossexualidade características como intelectualidade, estética e ética, sendo mais nobre do que um relacionamento hétero? Estes só para citar alguns exemplos.

Hoje, em pleno século XXI, comemoramos os 40 anos de Stonewall. Um marco na luta pelos direitos dos homossexuais modernos. E ao mesmo tempo quase nada, se comparada em idade com os registros anteriores. Ainda assim presenciamos ataques homofóbicos, como os ocorridos na Parada de São Paulo. O que poderia explicar a não aceitação de algo que, já foi comprovado, é mais antigo do que o próprio Cristo? No Brasil, por exemplo, homofobia não é considerada crime nem a união civil entre pessoas do mesmo sexo é legal. Apesar da persistência de alguns problemas, é mais do que justo concluir que muito melhorou. E pode melhorar ainda mais. Vejamos a seguir algumas conquistas do movimento.

Paradas Gay – a primeira herança
Conforme os veteranos de Stonewall relataram ao site A Capa, ser gay, definitivamente, não era algo pelo qual pudessem se orgulhar até a década de 70. Não pelo menos em público. Gays sempre existiram e sempre vão existir, haja repressão ou não. Mas até o ano de 1969, tudo era feito na penumbra. "Stonewall foi a tomada da palavra pelos homossexuais. A passagem da posição de objetos, da perseguição, inclusive policial, para a posição de sujeitos que desejam ser reconhecidos como tais e deixar de ser martirizados pelo preconceito, pela violência abusiva do outro. Stonewall surgiu no epicentro da revolução sexual dos anos 60 no qual a palavra de ordem era liberdade. O termo ‘gay pride’ mostra que antes de Stonewall, os gays viviam com amargura e vergonha. Nesse momento eles saíram do armário – que não é um lugar confortável – e foram para as ruas", disse o psicanalista Marco Antonio Coutinho Jorge durante colóquio sobre o tema na Universidade Veiga de Almeida, no Rio de Janeiro.

Nesse período, começou ainda em Nova York o surgimento das primeiras entidades LGBTs e a primeira parada do orgulho gay. Sim, agora ser gay não era mais uma questão de natureza. Era também uma questão de orgulho. Desde então, o evento começou a ser celebrado em diversos países. O Brasil é o país recordista em número de Paradas – 127 só em 2008. Sediamos ainda a maior de todas, em São Paulo, que não por acaso ocorre no mês de junho. Foi nessa época ainda, segundo Glória Sadala, que surgiu o termo "gay". "Foi uma tentativa de apagar o teor psiquiátrico contido na palavra homossexual, criada em 1869 pelo escritor jornalista austro-húngaro Karoly Maria Benkert. Portanto, gay é um termo politizado, ligado à defesa dos direitos humanos", disse a psicanalista que também participou do  colóquio no Rio.

Homossexualidade: da doença à normalidade
Bem aceita na antiguidade, é no período do Cristianismo, no entanto, que a situação começa a se inverter, ainda que gays estivessem nos mosteiros e acampamentos militares. Tratada como perversão, a homossexualidade foi tema de diversos estudos desde então, como o do cientista inglês George V. Hamilton, que a pesquisou inclusive em primatas. Várias foram também as tentativas de tentar curá-la. Os tratamentos incluíam internações em clínicas que aplicavam choques eletricos e até lobotomia. Felizmente, ninguém foi curado.

Com o surgimento da psicanálise, a partir das idéias de seu Pai, Sigmund Freud, timidamente, este caminho tortuoso começava a tomar seu rumo em direção à despatologização. Freud teria dito que todo ser, em essência, é bissexual. Sua obra máxima em que discute o assunto é o livro "Três ensaios". "Não há consenso entre os analistas sobre a homossexualidade. Qualquer teoria que a generalize é falsa, preconceituosa e abre o caminho para a discriminação e, quando não, a eugenia. Existem homossexuais patentes, latentes ou sublimados. Freud chegou a colocar a questão da homossexualidade como mistério", disse o doutor em Filosofia Antonio Quinet.

Nos anos 40, outra revolução: Dr. Kinsey, sexólogo americano, criaria a escala Kinsey, sugerindo que nosso comportamento poderia variar do extremamente hétero ao extremamente homo. Finalmente em 1973 a Associação de Psicologia Americana retirava a homossexualidade da lista de doenças psiquiátricas. A Organização Mundial de Saúde faria o mesmo em 1990. Outro avanço recente e significativo no campo da saúde, pelo menos no Brasil, foi a decisão do SUS de fazer cirurgia de mudança de sexo a partir do dia 12/12/2007.

A luta pelos direitos e a união civil
Um campo importante e que precisa avançar muito é o jurídico. A união civil entre pessoas do mesmo sexo é um dos assuntos mais discutidos quando se trata de direitos homossexuais. Poucos países hoje a reconhecem integralmente. Mesmo assim é um grande passo e pode servir de incentivo para que outras nações façam o mesmo. É o caso de Espanha, Canadá e Bélgica. Já países como Estados Unidos (estado de Massachusetts) e Argentina (cidade de Buenos Aires) reconhecem parcialmente esse tipo de união.

Por outro lado, Irã e demais colegas que cultuam o islamismo estão longe de atingir algum avanço: a homossexualidade é duramente reprimida e pode levar à morte seus "praticantes". No Brasil, o projeto de união está emperrado desde 1995, quando foi criado pela então deputada Marta Suplicy. Timidamente, a situação começa a mudar em alguns aspectos. Algumas empresas privadas já aceitam, por exemplo, a inclusão do parceiro como dependente no plano de saúde. Outra questão pertinente é a adoção de crianças. O primeiro caso oficial no país ocorreu em 2006, quando Theodora, com então 5 anos, foi adotada pelos gaúchos Vasco Pedro da Gama e Júnior de Carvalho, com 38 e 46 anos respectivamente na época. A decisão foi dada pela juíza Sueli Juarez Alonso, da 2ª Vara Criminal da Infância e da Juventude de Catanduva, interior de São Paulo. Até então, somente Vasco era considerado pai da pequena Theodora. Três anos depois, vários casais já conseguiram adotar, conseguir a guarda de seus filhos biológicos de um antigo casamento heterossexual.

Visibilidade na mídia e Pink Money
Embora até hoje não tenha ocorrido um beijo gay nas novelas brasileiras, o assunto não é novidade em países como Estados Unidos e Inglaterra. Gays estão em diversos seriados e outros programas de TV e não necessariamente são retratados como meros estereótipos. Beijam, transam, enfim, fazem o que bem entendem. Como na bem sucedida série "Queer as Folk" – aqui no Brasil com tradução de "Os Assumidos" e exibida sem alardes pela TVA. Gays estão ainda em anúncios publicitários e até apresentando telejornais, como o jornalista David Cooper, da CNN.

As antigas aberrações hoje parecem também a salvação de muitos que começam a enxergar os gays como um mercado consumidor bastante lucrativo. Segundo o livro "O mercado GLS", de Franco Reinaudo e Laura Bacellar, o "pink money" tem potencial para render R$ 111 bilhões por ano. Nada menos do que 18 milhões de brasileiros se declararam gays, ou seja, 10% da população. Desse total, 47% são de classe B e 36% da classe A. E nenhum costuma economizar quando o assunto é qualidade. Não que as bichas sejam ricas, mas na falta de filhos e outros compromissos, chegam a gastar 30% a mais do que um casal hétero. Além disso, homossexuais, em geral, apresentam gosto sofisticado, dando mais valor a objetos caros, como roupas, relógios e outros acessórios de marca. Há sites, revistas especializadas, enfim, uma gama de produtos que começam a surgir para suprir as necessidades desse público.

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