Do lixo ao luxo
Ecomoda, green labels, moda verde, sustentável ou ecológica. Tanto faz! O importante é vestir a camisa em prol do meio ambiente
Garrafas pets viram blusas. Películas de cinema transformam-se em bolsas. Planta tradicional da Amazônia torna-se tecido 100% ecológico. Difícil de acreditar? Nada como criatividade, bom gosto e pensamento vanguardista para estilistas levarem às passarelas e para o dia-a-dia uma moda ecologicamente correta.
Os acessórios utilizam material reciclado e as roupas são feitas a partir de fibras, tintas e tecidos naturais, que na hora da produção não utilizam produtos químicos, fertilizantes, pesticidas ou qualquer produto prejudicial à natureza.
A designer Rubia Calazans recicla a película de cinema, material que leva mais de 100 anos para se degradar, na confecção de bolsas, tops, colares, entre outros. "Comecei a reciclar com fitas K7, filme fotográfico e depois veio a película. Reaproveitar sempre fez parte do meu contexto de vida", conta a carioca que faz esse trabalho há 6 anos.
Em todas as peças de Rubia, os acabamentos são feitos manualmente. Uma equipe que faz o processo inicial, mas a finalização fica por conta da designer. O material reciclado é trabalhado com pontos de crochê, fechos de velcro ou metais. Além de ser uma atitude que a natureza agradece, Rubia explora a transparência, opacidade e brilho da película sendo possível visualizar as imagens dos filmes.
No caso de tecidos, existe um exemplo de pesquisa bem sucedida que traduz o esforço e dedicação do estilista Caio Von Vogt. Há aproximadamente 10 anos, ele criou o primeiro tecido 100% ecológico e orgânico do mundo, o EcoVogt, com patente e registro internacional. Este é fabricado pela Companhia Têxtil de Castanhal e feito de fibra de juta, planta cultivada na Amazônia.
Inicialmente, a juta era utilizada apenas na produção de sacos, forração de tapetes, entretelas e outros. A partir da pesquisa desenvolvida por Von Vogt, agora é possível utilizá-la na confecção de camisetas, ecobags (bolsas que substituem as sacolas plásticas), cintos e etc. "O benefício do EcoVogt é que em contato com a natureza leva apenas 2 anos para se degradar, enquanto fibras sintéticas de poliéster levam 100 anos. O plástico 500 e o algodão 10", conta o antenado estilista.
O que faz com que o tecido EcoVogt seja 100% ecológico e orgânico é o processo de utilização de fixadores e amaciantes extraídos de plantas nativas brasileiras na hora do tingimento. São plantas como açafrão, pau-brasil, urucum, entre outras, que trazem a cartela de 12 cores.
Para Von Vogt, o que ajudou a mudar a cultura da reciclagem e faz com que as pessoas se conscientizem é a campanha "Eu não sou de plástico", que inicialmente veio da Europa e dos EUA com a intenção de eliminar as sacolas de plásticos com opções de bolsas na hora de carregar as compras. "Isso veio para clarear a idéia das pessoas", diz o estilista.
Porém, ele afirma que no Brasil temos um problema cultural. "Não é possível mudar da noite para o dia certos hábitos, como fechar a torneira na hora de escovar os dentes ou tomar banho rápido. Para muitos ainda é utópico dizer que a água vai faltar, pois por enquanto não é uma necessidade real", esclarece Von Vogt. Ainda assim ele espera que as próximas gerações sejam mais conscientes, já que todo esse problema sócio-ambiental é muito recente no Brasil, mas tende a ser passado na educação das crianças de hoje.
Nas Passarelas
No São Paulo Fashion Week, em junho, Oskar Metsavaht, estilista da Osklen, causou furor ao utilizar couro e plástico em sua coleção. Mas, segundo o estilista carioca, conhecido por ser pioneiro da moda sustentável, as peças serviram para alertar o que de fato é mo-da ecologicamente correta. Metsavaht reciclou o plástico para fazer chapéus, coletes e capuzes.
Já o couro foi utilizado por haver uma superpopulação de jacarés que afeta o desequilíbrio da fauna na Amazônia. Então, muitas instituições abatem os animais, deixam a carne com a população local e aproveitam a pele para a moda. Além de estilista, Metsavaht é médico e criou o Instituto E para avaliar materiais que não afetem o meio ambiente e que possam ser utilizados pela indústria da moda.
No SPFW, o reaproveitamento de materiais também foi tema das grifes Maria Bonita, UMA e Jefferson Kulig. A primeira utilizou tecidos orgânicos e fibras naturais, ao passo que UMA reciclou borracha prensada sobre tafetá e Kulig mesclou elementos tecnológicos e orgânicos criando a expressão tecnôrganico.
Eco Fashion Brasil
Para os universitários ou recém formados em moda, que pensam em fazer roupas conscientes, uma boa opção é participar do concurso Eco Fashion Brasil. É o caso da estudante Romênia Ishiyama, que acredita ser uma necessidade pensar em moda sustentável. "Como estudante e futura profissional tenho responsabilidade e obrigação de ajudar a indústria a encontrar soluções menos agressivas", afirma Romênia.
A universitária irá retratar em sua coleção a Mata Atlântica, que foi preservada em Itacaré (BA) e para isso vai utilizar tecido orgânico, fibra de coco, de juta, entre outros. O concurso utiliza como critério de seleção a inserção da idéia de sustentabilidade na indústria da moda. Sobre os benefícios que o Eco Fashion Brasil traz, Romênia diz que são iniciativas como essa que refletem para onde é preciso caminhar. "A indústria têxtil precisa aprender a cuidar do meio ambiente", afirma a estudante.
Rubia Calazans http://www.byrubiacalazans.com
Caio Von Vogt http://www.caiovonvogt.com.br
Eco Fashion Brasil http://www.ecofashionbrasil.com
* Matéria originalmente publicada na edição #16 da revista A Capa Especial Meio Ambiente – Setembro de 2008