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Possibilidade de sair com outras pessoas sem envolvimento emocional atrai casais gays

A história se repete várias e várias vezes: um amigo chega e confessa que traiu o namorado com outro. Em comum, todos dizem ter sido “sexo carnal, sem sentimento”. O próximo passo é abrir o relacionamento. Para uns, separar sexo e afeto é o caminho mais saudável para um casal ser feliz para sempre. Para outros – poucos, diga-se -, é pura sem-vergonhice.

Depois da revolução sexual, quando as pessoas perceberam que há várias outras possibilidade de ficar juntos, sem ser o tradicional casamento monogâmico, abrir a relação tornou-se uma questão a ser discutida a dois. Afinal, como canta Marina Lima na música Anna Bella, “a região do desejo não é a mesma que a do amor”. Mas será que, na prática, é fácil aceitar outro homem dividindo a cama com seu companheiro, mesmo que por somente algumas horas?

É fato

Está até no Orkut: “relacionamento aberto” e “casamento aberto” são opções possíveis para quem preenche seu perfil no maior site de relacionamen-tos do mundo. Na vida real, também. “Se eu começasse um relacionamento sério agora, já falaria logo de cara que gosto de sair e curtir outras pessoas”, avisa Ernandes de Oliveira, que trabalha com atendimento. “Sou totalmente a favor de abrir a relação, desde que haja respeito mútuo”, afirma. Tudo bem simples e direto.

“Relacionamento aberto entre homens gays hoje em dia é comum”, faz coro o estudante Alexandre  Alves. Mesmo nunca tendo vivido um, Mário já pensou a respeito. “Já quis muito, mas meu parceiro não. Minha intenção era beijar e transar a três, nunca um pra cada lado”, explica Alexandre. Assim como ele, cada um define a melhor maneira de abrir um relacionamento. As possibilidade são inúmeras, mas listamos as mais comuns no box.

O psicólogo Fabrício Viana, do TV Tudo, afirmou em um programa de rádio que “se o maridão desejar algum dia e eu estiver a fim, por quê não?”. O motivo, segundo ele, é a possibilidade de ampliar o prazer. “Já tive experiências a três e a quatro e foram maravilhosas. As sensações, o prazer, o contato físico com mais de uma pessoa é indescritível. Quem nunca experimentou, recomendo.” Parece tentador, né?

Fim da monogamia?

Basta sondar seus amigos gays para descobrir que a grande maioria defende os relacionamentos abertos. "A monogamia é uma construção social – nem tão antiga e nem tão universal como alguns gostariam de fazer crer. Acredito que ela não seja a melhor forma de viver um relacionamento”, diz o ativista GLBT Julian Rodrigues, do Instituto Edson Neris. Seria a monogamia antinatural? “Não colocaria como natural ou antinatural, mas é uma forma altamente castradora, repressora e se relaciona com o controle que o capitalismo e o patriarcado exercem sobre o corpo, sobre a sexualidade", completa.

Um dos principais argumentos de quem defende o relacionamento aberto é que, nesse arranjo, não há traição – e isso ajuda a manter o casal unido. “Traição é mentir, é abandonar, é fazer coisas que não tinham sido combinadas, é transar sem camisinha, é negar carinho, é se envolver com outra pessoa sem avisar”, resume Julian.

Honestidade

Mas a defesa do relacionamento aberto não se limita ao sexo. Em geral, os casais que optam por esse tipo de relação consideram-na mais saudável e principalmente honesta. Para eles, talvez seja a ultima chance de salvar o relacionamento. “É uma demagogia dizer que nunca haverá traição no casamento monogâmico, e é importante negociar isso”, diz Igo Martini, do Grupo Dignidade, de Curitiba. “Desejos todos temos e precisamos exercitar isso, desde que não magoe ninguém”.

“Uma grande parte dos casais gays abre porque é menos hipócrita”, afirma o webmaster Erik Galdino. “Afinal são homens que, por natureza, têm um apetite sexual mais aguçado. Por isso, se não abrir vai acabar ficando com outros caras. Então, melhor que seja uma situação de comum acordo”. Mas, Erik pondera: “Um relacionamento começa fechado e tem gente que vive por anos desta maneira, não é uma questão generalizada, mas afeta grande parte dos gays”.

No entanto, para quem está envolvido com outra pessoa, abrir-ou-não-abrir nem sempre é uma decisão fácil. Vários fantasmas começam a assombrar a mente: o medo do outro se apaixonar, ou achar o terceiro elemento de cama melhor, mais bonito, mais interessante, ou ficar envergonhado sobre o que os outros vão pensar. Vale lembrar, no entanto, que a insegurança está presente em qualquer relacionamento, mas o ineditismo do “open relationship” torna essas assombrações ainda mais temíveis.

Cobranças

Um problema inerente aos casais que têm relacionamentos abertos bem-resolvidos é a pressão social. Ainda tem muita gente conservadora que acha isso tudo uma “pouca vergonha” ou, pior, acredita ser um sinal de que o casamento ou namoro não anda bem.

“Quando um gay abre o casamento, as pessoas passam a se ver como um namoro não muito sério”, diz Mário. “Isso vem do preconceito e do estereótipo do gay promíscuo”.

“Meu namorado é 14 anos mais novo e, por isso, acham que abrimos a relação porque eu não dou conta do recado”, desabafa o produtor de eventos Ricardo Nicoleti. “Ou, então, pensam que ele não sente tesão por mim, que está junto só porque represento estabilidade e, por causa disso, sai pra caçar outros homens”.

É preciso jogo de cintura e terapia para driblar a cobrança externa. Para Ricardo, é necessária muita coragem para viver um relacionamento sem parâmetros tradicionais. “Mato um leão por dia e ainda enfrento as bilus que têm fetiche em homens casados”. Estes, segundo Ricardo, têm prazer em pegar o homem do outro. “Quando digo que meu namorado sabe de tudo, eles ficam desestimulados”.

Ciumentos

O ciúme está relacionado com o medo da perda. No caso dos relacionamentos abertos, os casais buscam superar o sentimento de posse. “Tive ciúme nos primeiros meses, quando não tinha certeza se éramos apaixonados e se o relacionamento era sólido”, diz Julian. “É preciso nos libertarmos do ciúme do corpo, do sentimento de posse. Quando os dois amam, a posse do corpo, o tempo inteiro, passa a ser algo quase ridículo. A monogamia, além de hipócrita, é autoritária. Ela se baseia na castração do desejo. A maior vantagem do relacionamento aberto é a verdade”.

Talvez por isso que o sexólogo Silvério da Costa Oliveira, da Sociedade Brasileira de Sexualidade Humana, acredita que há mais adeptos de relacionamentos abertos nos grandes centros urbanos. "O anonimato facilita muito as coisas. Você pode freqüentar lugares sem correr o risco de sua família ou de seu vizinho saber, ao contrário de uma cidade pequena, onde se corre o risco de sempre alguém ver.”

Como assim?

Se você tem vontade de abrir o relacionamento, mas não sabe por onde começar, o principal conselho é: vá devagar. Afinal, uma palavra errada pode deixar seu parceiro confuso. Para o psicólogo Silvério, um bom começo é falar abertamente das fantasias. Segundo ele, conversar sobre isso fica mais fácil quando as coisas andam bem na cama para o casal. A comunicação é a chave para o sucesso desse tipo de relação.

Outro ponto importante é aceitar os limites do outro. “E aí não pode ter muita negociação, é aceitar e pronto”, afirma a psicóloga Cátia Oliveira. “Um não pode impor o quanto quer de liberdade para o outro. Tem de ser consensual, senão a relação desmorona”.

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